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Manifesto das Eurocidades da Raia Luso-Espanhola

18 Maio 2020

São seis as medidas elencadas contra as consequências do encerramento de fronteiras

No dia 5 de maio de 2020, os Presidentes das Câmaras Municipais e os Alcaldes dos Ayuntamientos das sete Eurocidades da fronteira entre Espanha e Portugal reuniram-se pela primeira vez num fórum on-line convocado e organizado pelo Agrupamento Europeu de Cooperação Territorial (AECT) Eurocidade Chaves-Verín. O objetivo deste seminário online passou por partilhar um espaço de diálogo e reflexão com os presidentes das Eurocidades Ibéricas para descobrir qual o impacto do COVID-19 na cooperação transfronteiriça, como a declaração do estado de emergência e como o encerramento das fronteiras afetou os cidadãos das diferentes regiões, e por fim, as medidas propostas para fortalecer as relações de proximidade após a crise.

Durante as intervenções, revelaram concordância nos problemas existentes e nas necessidades, demonstrando interesse em aprofundar os laços de cooperação, de forma a recuperar a confiança dos cidadãos bem como o tecido económico, do impacto gerado pelo encerramento da fronteira decretado como consequência da crise provocada pela Covid-19.

Este alinhamento de interesses é o que motiva a criação deste Manifesto através do qual se afirma, vincando uma posição construtiva, a necessidade de restaurar a liberdade de trânsito no âmbito das Eurocidades e demonstrar que a sua ausência altera a realidade que é vivida entre localidades “irmãs”; recordando que há várias décadas se trabalha diáriamente a partir de uma perspectiva em que o conceito de fronteira foi obliterado como ponto de separação, sendo observado a nivel institucional, económico e social como um elo de união.


OS REPRESENTANTES DAS EUROCIDADES DA FRONTEIRA LUSO-ESPANHOLA MANIFESTAM QUE

· A Raia Ibérica, a fronteira mais estável e com 1.214 km de extensão, é considerada a mais vasta da União Europeia, ao longo da sua história. Mesmo em tempos que foram marcados por conflitos, sempre se considerou um espaço permeável para as populações que estabeleceram redes de cooperação a nível social, económico e afetivo.

· Estes vínculos de colaboração acima referidos e estabelecidos a nível social começaram a ser fortalecidos a partir do dia 1 de janeiro de 1986, data em que Espanha e Portugal entraram oficialmente na Comunidade Económica Europeia e, como membros efetivos, passam a ser participantes ativos das políticas de cooperação através das quais a União Europeia, além de promover as relações comerciais entre os estados, procura transcender o aspecto económico e envolve a sociedade europeia na construção de um projeto conjunto.

· Para além de programas concretos, as políticas de cooperação contam com os Agrupamentos Europeus de Cooperação Transfronteiriça (denominados AECT de agora em diante) como um instrumento válido para a consolidação institucional dos laços de cooperação existentes entre territórios transfronteiriços. Mas é no conceito de Eurocidade que a cooperação que a UE procura promover alcançou sua expressão máxima. A razão para o alto grau de simbiose alcançado entre as localidades que fazem parte de uma Eurocidade deve-se ao fato de que essa mesma simbiose é consequência de um entendimento prévio a nível social. Ou seja, antes da formação das Eurocidades, já existiam espaços comerciais, económicos, sociais, familiares e de lazer partilhados que permitiram a construção de acordos entre entidades locais nos dois lados da Raia. Resumindo, estas realidades são um exemplo de construção de baixo para cima (bottom-up).

· Em concreto, em todas as eurocidades da fronteira luso-espanhola, independentemente dos diferentes ritmos de concretização institucional, os cidadãos possuem relações sociais sólidas e laços históricos que teceram os alicerces da cooperação neste território. A cultura do contrabando, questão importante, também foi, em tempos de escassez, uma forma de vida comum a toda a Raia Ibérica que, por décadas, significou a revitalização das economias a nível local pois desenvolveram-se as relações transfronteiriças, consideradas como bases de todos estes avanços institucionais.


Os programas de cooperação, promovidos e financiados pela União Europeia, fortaleceram a consciência coletiva nas localidades que compõem as Eurocidades, a ponto de não ser possível explicar as relações no comércio, gastronomia, cultura, lazer, dinâmica social ou estruturas económicas sem entender a mecânica da interação entre a totalidade dos núcleos populacionais que os formam. Quando um eurocidadão da Raia Ibérica se desloca entre as localidades que compõem esses espaços, não é perceptivel para o mesmo que acaba de mudar de local, nem é perceptivel a existência de uma fronteira; simplesmente desloca-se a outro local dentro do “todo” onde habita.


· Neste contexto, setenta anos depois da Declaração de Schuman e coincidindo com o vigésimo quinto aniversário do Tratado de Schengen (26 de março de 2020), em consequência da crise da Covid-19, as fronteiras são encerradas, sem ter em conta a natureza excepcional de uma Eurocidade, uma figura promovida pela própria União Europeia e pelos Estados que fazem parte da mesma há décadas. Além disso, os planos de desconfinamento gradual não incluem um roteiro concreto que permita eliminar as incertezas existentes em relação à regularização do tráfego entre estas localidades.
Na prática, o encerramento de fronteiras equivale a construir muros entre bairros de uma mesma unidade populacional. A situação atual afeta as relações familiares, os projetos sociais, as iniciativas comerciais interdependentes e a dinâmica económica a nível local; dinâmica esta que molda a vida cotidiana de uma Eurocidade. Mas o que pode ser ainda mais impactante é o efeito que essa mesma situação, prolongada ao longo tempo, pode ter na confiança mútua. Este é o principal efeito que deve ser evitado, pois, se essa confiança se quebrar, será muito dificil recuperar a dinâmica pré-Covid.

· Do ponto de vista económico, o encerramento das fronteiras gera um impacto adicionado à grave situação decorrente do confinamento decretado em ambos os países que, embora exista a vontade de avançar na recuperação da atividade económica, nas Eurocidades da fronteira luso-espanhola, a dinâmica existente exige o fluxo de cidadania entre os aglomerados populacionais que compõem a Eurocidade independentemente do lado da Raia em que estejam. Os setores principais de atividade na fronteira, como hotelaria, comércio, cultura ou lazer, exigem tráfego transfronteiriço para que se tornarem viaveis, independentemente das condições que as empresas devam assumir no cenário pós-Covid.

DECLARAÇÃO DE INTENÇÕES DAS EUROCIDADES DA FRONTEIRA LUSO-ESPANHOLA

Tendo em conta as premissas apresentadas anteriormente, os representantes das Eurocidades da fronteira luso-espanhola colocam as seguintes intenções:

· Proceder à abertura das fronteiras ou, mais específicamente, decretar a livre circulação dos cidadãos das Eurocidades da fronteira luso-espanhola entre os núcleos populacionais que compõem cada uma delas.

· Estabelecer um protocolo específico para a fronteira entre Espanha e Portugal, tendo em conta as fases de desconfinamento em que os territórios estão imersos, o que proporciona aos cidadãos, independentemente do seu país de residência, garantias legais similares e a nível de controlo da saúde pública .
· Reconhecer o status de "Eurocidade" nos dois Estados de forma a definir um protocolo de ação em situações de crise em que a singularidade dessas áreas de fronteira seja considerada, possibilitando estabelecer medidas específicas para as localidades que as compõem.

· Solicitar meios de financiamento à União Europeia e aos Estados, através do Programa Operacional de Cooperação Transfronteiriça Espanha-Portugal 2014-2020 ou através da constituição de ITI’s transfronteiriças (Investimentos Territoriais Integrados) para aliviar o impacto económico produzido pela crise da Covid-19 de forma a ser possível apoiar os agentes locais e económicos das Eurocidades.

· Contemplar um plano para a recuperação de espaços fronteiriços com base na projeção das Eurocidades como aglomerações urbanas transfronteiriças seguras, longe de centros de contágio e que apostam em conjunto na segurança, saúde e bem-estar em suas ofertas comerciais a nível gastronómico, cultural, turístico e a nível de produção.

· Promover campanhas de sensibilização e comunicação próximas ao cidadão, destinadas a restabelecer laços de confiança e a melhorar a cultura de cooperação que existia na esfera social e empresarial, nas Eurocidades, antes do encerramento da fronteira.